terça-feira, 10 de novembro de 2020

O impostor

                                            Nilson Souza*

 

Mandei um link por Whats para um amigo escritor, convidando-o para uma reunião por Zoom no dia seguinte. Para quem chegou agora de Marte, traduzo: encaminhei uma mensagem pelo conhecido aplicativo de bate-papo com o atalho para o amigo clicar e ingressar numa videoconferência. Sabem o que ele me respondeu? 

− Fala, Nílson. Tudo bem? 

A cordialidade sempre me cativa. Dei trela (ou tecla): 

− Meus companheiros estão entusiasmados com a tua presença na nossa reunião de amanhã. 

Ele demonstrou satisfação: 

− Que legal! Fico feliz. 

Em seguida, me questionou: 

− Será que poderias me ajudar? Sabes mexer com aplicativo de banco? 

Como todos nós tropeçamos na tecnologia de vez em quando, respondi: 

− Com os meus, sei. Ainda hoje fiz o meu cadastro no Pix. 

Aí meu interlocutor fez uma proposta que mudou o rumo da nossa prosa: 

− Preciso fazer uma transferência. Mas como já fiz duas hoje, excedeu o meu limite diário. Será que não poderias fazer pra mim? Amanhã eu já te devolvo. Com juros, se quiseres. 

O alerta da vigarice acendeu instantaneamente. Só hesitei um segundo para responder porque, na remotíssima hipótese de o meu amigo estar bêbado, eu não queria ser agressivo com ele. Digitei: 

− Bah, essa pegadinha é mais velha do que o Matusalém. 

Claro que “meu amigo” encerrou a conversa ali mesmo. Em seguida, liguei para sua casa e tive a confirmação. 

− Clonaram meu WhatsApp. Estão pedindo dinheiro para todos os meus contatos. 

O golpe é velho, mas se renova a cada minuto nesse mundo maluco das conversas virtuais. Os impostores não precisam roubar celulares. Roubam senhas, códigos, acessos, agendas e intimidades. Quase convidei o malandro para participar da nossa reunião do dia seguinte, pois certamente ele teria coisas interessantes para nos contar. 

Outro dia, um desses larápios virtuais, flagrado em pleno ato, foi questionado pela vítima: 

− Você pega muita gente com isso aí, velho? 

Pensam que o criminoso fugiu da raia? Respondeu, orgulhoso: 

− Se eu fizer 50 ligações por dia, de umas 39 eu consigo o código. 

E ainda se gabou: 

−Hoje eu consegui R$ 2 mil e 500. R$ 6 em dois dias, tá bom né? Imagina R$ 20 mil em duas semanas. 

O diálogo foi divulgado por uma empresa de segurança da internet. Mas este escriba que vos digita com os dedos do mundo virtual e os dois pés cravados na cautela analógica também tem uma mensagem para compartilhar: não repassem senhas, códigos e muito menos dinheiro nem mesmo para as nossas queridas e insuspeitas mães. 

(*Em Zero Hora, novembro de 2020)

Nenhum comentário:

Postar um comentário