segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

O que é certo e o que é errado

 Leon Eliachar

P: É feio comer galinha com as mãos? 

R: Absolutamente. Ninguém pode negar que é muito mais prático, mais confortável, mais gostoso e mais higiênico. 

Feio mesmo, se não impossível, é comer galinha com os pés. 

P: Não se deve jogar cinza no chão? 

R: Não, não se deve. Mas se a gente não tivesse insistido nisso, jamais teriam inventado o aspirador de pó. E hoje, que já o inventaram, se não continuarmos jogando (a cinza) admitamos que ele (o aspirador) terá pouca utilidade. 

P: É feio atirar restos de prato pela janela? 

R: Tudo depende do ângulo em que nos colocamos: 

Se estamos do lado de dentro da janela, é óbvio que isso nos parecerá um gesto bastante natural. Só devemos ter cuidado de não botar a cabeça no parapeito, pra ver se os restos caíram na cabeça de alguém, porque assim a pessoa acabará localizando de qual andar foram atirados os restos e poderá vir cá em cima pedir explicação. 

Agora, se nos colocamos no ângulo de baixo, o melhor negócio é atirar restos para dentro das casas e sair correndo, porque a polícia não vai compreender nunca que estamos querendo colaborar com a limpeza urbana. 

P: A gravata é realmente um toque de elegância? 

R: Tudo é relativo, há sujeitos que usam gravata branca em cima de camisa preta, outros que usam gravata preta em cima de camisa branca, outros que usam gravata colorida em cima de camisa estampada. Como se vê, tudo depende da gravata − e é chato um sujeito ter de depender de uma gravata para parecer elegante. Mesmo porque os gostos são diferentes, tão diferentes que, quando um sujeito pensa que está elegante, aparecem logo dez que o acham cafajeste. 

P: Ser pontual revela a personalidade? 

R: Isso é um fato. Mas nunca ninguém pode saber se uma pessoa é pontual, a não ser que também chegue na hora. E, se chegar, quem pode garantir que o outro também chegará? 

Logo, o mais aconselhável é chegar sempre atrasado; ás vezes coincide do atraso ser igual, e então ambos se acharão fabulosamente pontuais e de muita personalidade. 

P: É imoral o uso do biquíni? 

R: O Conceito de moral varia muito: O namorado acha indecente que a namorada use biquíni, mas não acha que a dos outros use. Por isso mesmo que o biquíni foi inventado: para que seja usado pela mulher dos outros. 

Pensando bem, até que o biquíni tem o seu lado moral: 

Já imaginaram um teatro de revista sem biquíni? 

Como é que os empresários poderiam enfrentar a censura? 

P: É correto um rapaz beijar uma moça antes de pedir a sua mão? 

R: Rapaz que não beija a moça é considerado correto pelo pai da moça, mas é considerado bobo pela própria. 

Antigamente, o rapaz pedia a mão da moça e depois a beijava (a mão); hoje, beija primeiro a moça e depois é que pensa se vale a pena ou não pedir também a sua mão. 

Donde se conclui que os tempos mudaram. Digo, os tempos mudaram as moças. 

P: É falta de cavalheirismo um homem viajar sentado num ônibus enquanto senhoras viajam de pé? 

R: Não, se há a exclusividade de lugar. 

A população feminina cresce de tal maneira que os ônibus andam superlotados. 

Tão superlotados que não há mais lugar nem para o cavalheirismo. 

P: É verdade que o caráter das pessoas se revela no jogo? 

R: Em questão de jogo é sempre mais aconselhável ter mais jogo do que caráter, porque ambos estão arriscados a encontrar um jogo mais forte e um caráter mais violento. 

O Jogo a gente revela quando está ganhando; o caráter quando está perdendo. 

Muita gente de caráter perde tanto no jogo que, inclusive, acaba perdendo o caráter; Algumas vezes chega a recuperar tudo − menos o caráter. 

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Do livro: “O homem ao quadrado”, páginas 273, 274, 275.¨

 P.S. No texto original não há a letra P, de pergunta.

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