Yoko Ono não acabou com os Beatles.
Ela os salvou deles mesmos
Eduardo Bueno*
Caricatura da Internet
A
história é bem conhecida. Em novembro do ano da graça de 1966, o beatle John,
ex-aluno da Faculdade de Artes de Liverpool e no auge da fama, foi convidado
para ver uma exposição na Indica Gallery, em Londres. John Dunbar, marido da
cantora Marianne Faithfull, era o dono do pedaço e disse para Lennon que a
exposição Pinturas e Objetos Não Terminados, de uma artista japonesa de
vanguarda, iria lhe agradar. Lennon levou fé na indicação e foi à galeria antes
da abertura da mostra. Ao entrar, a primeira coisa que viu foi uma maçã à venda
por
No
meio da sala, havia uma escada de madeira, dessas que se pode comprar em
ferragens. Acima dela, um pequeno quadrado de lona preta estava suspenso no
teto e dele pendia uma lupa estilo Sherlock Holmes. Lennon galgou degrau por
degrau, chegou ao topo, pegou a lupa e num pedaço de papel colado na lona leu,
em letras minúsculas, a palavra “Sim”. “Se ali estivesse escrito ‘Não’, ou
‘Dane-se’, eu teria ido embora na mesma hora. Mas era ‘Sim’ e eu gostei”. A
seguir o beatle se aproximou de um quadro em branco na parede. Era o projeto
Hammer and Nail Art (a arte do martelo e do prego), no qual a artista convidava
os visitantes a “colaborarem com a criação martelando um prego nela”. Lennon
cravou o seu.
John
Dunbar então chamou a artista, que estava no fundo da sala ainda montando a
mostra, e disse-lhe que deveria falar com John Lennon. Ela nunca tinha ouvido
falar nele. Ele também nunca tinha ouvido falar em Yoko Ono. Tímida,
circunspecta, toda vestida de preto, ela se aproximou e sem dizer uma só palavra,
entregou-lhe um cartão que dizia: “Respire”. John Lennon cumpriu a ordem – e o
resto é história. Naquele exato instante, John e Yoko estavam formando um dos
casais mais lindos de todos os tempos. Ficaram juntos para sempre – até que o
assassinato estúpido de Lennon os separasse.
O
espetaculoso documentário Get Back, de Peter Jackson, com inacreditáveis oito
horas de duração (baseado em quase 60 horas gravadas em 1971, em dois estúdios
de Londres, um deles o da própria Apple), mostra a banda mais famosa de todos
os tempos apodrecendo feito uma maçã e todo mundo comendo aquela torta de
climão. Lançada no final de
Prefiro acreditar que Yoko Ono impediu os Beatles de se tornarem um pastiche deles mesmos. E hoje (18.02.2022), no dia em que ela completa 89 gloriosos anos, é uma boa hora para chamar pelo nome dela, no meio de um sonho no meio de uma nuvem, no meio da noite: “Oh, Yoko”.
Em Zero Hora, fevereiro de
2022.
* Eduardo Bueno (Peninha para os gaúchos) é autor de muitos livros, citamos alguns abaixo:
Brasil: Terra à vista!
Brasil, uma História
Náufragos, Traficantes e
Degredados
A Viagem do Descobrimento
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