Biu* Doido era o doido oficial de São José do Egito. O grande sonho de Biu Doido era ter um relógio. Terminou conseguindo um, velho e quebrado. Era, mais, uma casca de relógio, do que um relógio mesmo. Os desocupados da rua divertiam-se perguntando-lhe as horas e ouvindo, em troca da pergunta, uma enfiada de desaforos e pornografias.
Um dia, chegou um delegado novo em São José. Fardado de tenente, foi aconselhado a perguntar as horas a Biu Doido. Perguntou. Biu Doido olhou-o de cima a baixo e, vendo-o fardado, conteve-se a custo e disse:
− Eu só não lhe dou uma resposta, porque sei que o senhor é novato, aqui. Todo mundo, em São José do Egito, sabe que meu relógio não trabalha.
− Não trabalha?—espantou-se o tenente. E comentou:
− Então, não adianta!
Biu Doido, sereno, apresentou a contrapartida vantajosa do seu relógio:
− Não adianta, mas também não atrasa!
Ariano Suassuna em:
“A Pensão de Dona Berta e Outras Histórias para Jovens”
E quem é Biu Doido?
Um andarilho das ruas de São José do Egito, Severino Cassiano, conhecido de todos por Biu Doido e que na verdade não era sempre doido, tinha seus momentos de plena lucidez e era nesses momentos que Biu se revelava com suas respostas inesperadas e que jamais alguém imaginaria que pudesse sair de sua boca. O poeta popular de São José do Egito, Arlindo Lopes, transformou algumas destas respostas geniais de Biu doido em poesia:
Certa vez Biu se apresentou,
Surpreendendo os demais.
Usando duas gravatas,
Uma na frente e outra atrás,
E dizendo achar pouco,
Que se ele fosse louco,
Usaria outras mais.
Egito de Zé Clementino,
Já foi falando sorrindo:
Biu usou duas gravatas
Pensando ficar mais lindo.
Egito vou lhe dizer:
Fiz isso pra ninguém saber
Se tô chegando ou saindo.
Histórias de Biu Doido
Dizem que um certo dia uma mulher ia passando em uma rua de São José, e Biu estava subindo em um poste e ela parou e perguntou a Biu:
− Biu! O que você está fazendo trepado no poste? E sem pausa Biu respondeu:
− Vou chupar manga!
E a mulher intrigada falou:
− Mas, Biu, isso aí é um poste, não é um pé de manga não!
Ligeiramente Biu disse:
− Mas a manga tá no meu bolso.
(Do blog de Paulo Robério − Poeta Pajeuzeiro)
Inserido no Blog Sertão Poeta
Severino Cassiano Pereira, Mestre Bio (ou Biu) Doido, dono de tantas histórias, já é falecido, morreu com mais de noventa anos em São José do Egito-PE, suas proezas estarão sempre na lembrança daqueles que conviveram com ele e repassadas às futuras gerações. Ou seja, não há de morrer nunca!
* Em algumas narrativas grafam Bio e, em outras, Biu.
Mais historinhas de Biu Doido
Certa vez, Biu Doido pegou uma vareta, amarou nela um barbante e o colocou numa bacia cheia d’água. Alguém passou por ele e perguntou:
− Biu, o que você esta fazendo?
− Pois num vê? Estou pescando!
− Mas no barbante não tem anzol!
− E na bacia tem peixe?
*******
Um dia, um amigo perguntou a Biu o que era bom para coceira. Biu respondeu na hora.
− O bom é ter unhas grandes!
*******
Certa vez em uma farra, cercado por muita gente, Biu doido fazia rir aquele povo presente. Alguém, perguntou, com ironia
− Biu, já plantou muita melancia?
Biu respondeu
− Não, só a semente.
P.S. Severino Cassiano Pereira viveu 91 anos,
nasceu em 15 de maio de 1910 e faleceu em 19 de agosto de 2001.
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