domingo, 28 de julho de 2019

O último Gre-Nal da Baixada

By Gremio1983


Estamos na semana que antecede a última partida do estádio Olímpico (Brasileirão de 2012). Não fosse isso um fato importante por si só, o jogo marca também o último clássico Gre-Nal na Azenha (Grêmio 0 X O Internacional). Certamente será bem interessante poder vivenciar um evento histórico, um marco na história do clube.

Diante disso, eu me pergunto, o que efetivamente será lembrado desse evento nos próximos anos? O que será esquecido? O que aconteceu em situações parecidas com esta?

Pesquisando um pouco eu acabei encontrando fotos e uma crônica do último Gre-Nal disputado no estádio da Baixada. O jogo foi realizado em novembro de 1953, e foi vencido pelo Inter, que aquela altura já era campeão citadino. O evento em si parece não ter gerado maior comoção na época.

Eu confesso que fiquei um tanto surpreso com a Baixada retratada nessas fotos. Sabia que era um estádio acanhado (segundo o relato o campo estava lotado com pouco mais de 8 mil pessoas), mas, além disso, podemos ver claramente que as arquibancadas careciam de alguma manutenção (assim como também vemos um curioso placar manual e torcedores com sombrinhas). Talvez seja um retrato fiel da época; talvez não seja. E o que será que as pessoas iram “enxergar” daqui a 50 anos nas fotos do Olímpico?


“O segundo tento marcado pelos rubros foi de autoria do winger esquerdo Canhotinho. Acima vemos um flagrante do Gre-Nal de ontem, apanhando justamente na metade do lance que terminaria nas redes de Sérgio. Canhotinho, que se vê à esquerda, aproveitou a oportunidade para consolidar a vitória de sua equipe. Na foto vê-se ainda Mirão, Sérgio, Hugo, Bodinho e Zé Ivo.”

(Folha da Tarde Esportiva – 02 de novembro de 1953)

Internacional Manteve a Invencibilidade!

A falta de técnica no Gre-Nal foi compensada pela combatividade dos jogadores

Com o clássico Gre-Nal do foot-ball porto-alegrense, encerrou-se ontem o campeonato do ano em curso. As tradicionais dependências do “fortim” da Baixada apanharam, por esta ocasião, uma grande assistência, que as lotou completamente, em que pese a tarde cálida, que não animava o afeiçoado deter-se várias horas sob um sol causticante.

Não obstante, o velho campo da Baixada reviveu uma de suas horas mais animadas; pois o público, presente, como dissemos, em grande número, manteve-se sempre entusiasta e vibrante.

O match em si, como soe acontecer nos confrontos entre as equipes do Grêmio e do Internacional, não foi dos mais brilhantes, no que tange ao aspecto técnico. Mas não faltou combatividade aos jogadores, de modo que, em momento algum, o cotejo entrou em monotonia.

O S. C. Internacional, que já ingressou em campo, com as honras de campeão, indiferente ao resultado do Gre-Nal, logrou triunfar mais uma vez, fechando assim com chave de ouro sua temporada oficial, durante a qual não sofreu nenhuma derrota. Encontrou ontem no Grêmio um adversário bem mais capacitado do que, no fundo, calculava; mas, mesmo assim, galgou bem o obstáculo, completando sua campanha com mais uma vitória, justa, sem dúvida, e merecida; tanto mais que seu adversário, superando-se a si mesmo, mais que lhe dignificou a conquista.

De fato, o Grêmio, que vinha de uma decepcionante derrota frente ao Cruzeiro, capacitou-se de sua responsabilidade, como participe nato do mais importante choque do foot-ball porto-alegrense, e, se bem não tenha conquistado a vitória, reabilitou-se em parte, atuando bem melhor do que nas vezes anteriores. Mormente sua defensiva, sem embargo das vezes que foi vencida, se constituiu num setor bastante sólido e eficiente, considerando-se ainda que atuou sem dois titulares: Orli e Pipoca. Pôde assim o quadro tricolor impor séria resistência aos comandos de Bodinho, fazendo que as ações durante grande parte da contenda se equilibrassem e desta maneira emprestassem ao clássico uma feição emocionante.

O Internacional fez jus à vitória particularmente por duas circunstâncias: contou além de uma defesa soberba e coesa, com uma linha, que se bem menos brilhante, muitas vezes mesmo tolhida pelo adversário, foi suficiente prática para aproveitar as escassas oportunidades que se lhes ensejaram. E nisso vai o melhor elogio de um setor que encontrou difícil barreira pela frente, mas, que a despeito disso, ainda fez prevalecer sua classe, construindo um triunfo laborioso, todavia brilhante.

Os primeiros cinco minutos do embate caracterizaram-se pelo equilíbrio das ações: ambos os bandos alternaram-se na ofensiva, ensaiando estabelecer o primeiro predomínio territorial. Numa de suas investidas, o Internacional marcou, mas o juiz anulou o tento por estar Jerônimo, seu autor, em posição ilegal. Sucedeu-se um período breve de mais insistência do Grêmio na ofensiva; mas o Internacional revidou energicamente, colocando em sério perigo ao arco de Sérgio. Houve, então, uma fase de indecisão, durante a qual os dois teams não conseguiam firmar-se no ataque, em face do melhor trabalho das defensivas. A partir do 20º minuto, o Internacional passou a apresentar mais agressividade, controlando melhor as ações e ameaçando mais amiudamente o último reduto tricolor. Aos 32 minutos, Canhotinho, depois de fintar Mirão, desejou atirar violentamente ao arco; mas falhou e o arremate se converteu num passe a Jerônimo, que recém ingressara na área: o insider encheu o pé e surpreendeu Sérgio, cujo salto sobre a bola foi tardo: estava marcado o primeiro tento da partida:

Internacional 1
Grêmio          0

Depois da conquista desse gol, quando se acreditou que o Grêmio reagiria, viu-se pelo contrário, mais animado e tranquilo, o Internacional a aumentar o seu volume de ações, procurando a todo pano consolidar a vantagem com novo tento.
Desta maneira, o restante do período pertenceu nitidamente aos rubros, cuja dianteira, contudo, não obstante o maior número de investidas, não conseguia suplantar a vigilância dos defensores da Baixada.

Entretanto, aos 41 minutos, originou-se uma confusão diante do arco do Grêmio: Solis e Bodinho dela se aproveitaram, para alvejar, mas, em ambas as oportunidades, o couro foi devolvido, sendo que na segunda vez pelo arqueiro Sérgio, defendendo parcialmente: a bola derivou para a esquerda, onde Canhotinho, entrando oportunamente, entre dois defensores gremistas, logrou impulsionar a bola para dentro do arco estabelecendo o escore definitivo.

Internacional 2
Grêmio          0

No segundo período, viu-se o Internacional ainda predominando nas jogadas, durantes os primeiros minutos; mas a seguir o Grêmio repontou um pouco e carregou com alguma insistência sobre a área colorada. Nada de prática, porém, faziam os dianteiros do Grêmio, que não coordenavam as tramas, deixando-se desarmar pelos rubros com relativa facilidade.

Camacho e Paulinho, ainda no início dessa etapa, machucaram-se, retirando-se ambos por alguns instantes da cancha. O atacante gremista, contudo, não mais conseguiu recuperar-se. Foi deslocado para a ponta, onde passou a fazer mera figura. Jogou o Grêmio, assim, praticamente o restante do match com apenas dez homens válidos.

Podia por isso o Internacional, valendo-se dessa circunstância, assenhorar-se definitivamente do terreno e das ações, impondo ao adversário duro castigo. A dianteira colorada, porém, cada vez mais dominada pelos tricolores, não colaborou o suficiente para isso: de modo que o match foi-se arrastando, já agora com o Internacional mais preocupado em fazer passar o tempo, e conservar a vantagem inicial, do que mesmo alardear sua superioridade técnica.

Era virtualmente impossível, de resto, ao Grêmio, recuperar o terreno perdido; seu quinteto avançado já era uma peça nula, mas inoperante ficou depois que Camacho resumiu sua atividade a intervir em lances esporádicos.

O foot-ball, que já não era dos melhores, com Internacional agora a conformar-se com os 2×0 e o Grêmio impossibilitado de reagir, decaiu ainda mais; e teria resvalado definitivamente para a completa pasmaceira, não fosse a ação enérgica e laboriosa de alguns elementos, que não deixaram o jogo “morrer” de todo.

Não se registrou, porém, nenhum contraste nessa segunda fase, findando o match com o placar da fase inicial: 2×0, pró Internacional.

Ao terminar o cotejo, os jogadores, dando bonita demonstração de cavalheirismo, abraçaram-se amigavelmente, encerrando-se assim com exemplar cordialidade mais uma página do clássico eterno: o Gre-Nal.

Foi juiz do prélio o senhor Fortunato Tonelli, que em geral marcou bem as faltas, com erros de pequena monta. Às vezes, querendo resguardar sua autoridade, excedeu-se nas repreensões, desagradando a torcida e os jogadores. Mas conseguiu levar a bom termo sua espinhosa missão.

Na preliminar, bateram-se os quadros de aspirantes das duas agremiações. Alardeando grande superioridade técnica, os rapazes do Grêmio levaram a melhor, por um escore que não reflete sua inconteste supremacia nas jogadas: 1×0 […] Ao encerrar-se o match, demonstrando cabalmente o inconveniente, injustificavelmente não reprimido, de soltar rojões em campos de foot-ball, um deles estourou junto às vistas de um player gremista, somente por grande sorte não se registraram consequências lamentáveis.”

(Folha da Tarde Esportiva – 2 de novembro de 1953)

Ficha técnica da partida

Grêmio 0 x 2 Internacional

GRÊMIO:

Sérgio, Hugo e Noronha; Mirão, Laerte e Zé Ivo; Tesourinha, Bebeto, Camacho, Mujica e Torres.

INTERNACIONAL:

Milton, Lindoberto e Oreco; Paulinho, Salvador e Odorico; Luizinho, Solis, Bodinho, Jerônimo e Canhotinho.*

Data: 1º de novembro de 1953, domingo;

Local: Baixada, em Porto Alegre-RS;

Público: 8.955 (6.287 pagantes);

Renda: Cr$ 163.740,00

Árbitro: Fortunato Tonelli;

Auxiliares: Belo e Sroka;

Gols: Jerônimo aos 32 minutos e Canhotinho aos 41 minutos do primeiro tempo.

*****

*Dois anos depois desse Gre-Nal, em 1955, aos dez anos, eu assistiria ao meu primeiro clássico: com o time do Inter com os seguintes jogadores: Lapaz, Florindo e Oreco; Mossoró, Odorico e Lindoberto; Luizinho, Bodinho, Larry, Jerônimo e Chinesinho.

Com exceção do goleiro Milton, do lateral Paulinho, do zagueiro Salvador, do meia Solis e do ponteiro Canhotinho, o restante do time jogou esse Gre-Nal inesquecível da minha vida.

NSM


O Fortim da Baixada

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