Por Alexandre
Versignassi
(Jean Louis Gerome
Ferris/Wikimedia Commons)
Qual é a origem do dia?
O feriado mais importante dos EUA
começou como uma festa de comemoração de colheita – quem vive de plantar e
colher festeja esse segundo momento com intensidade, pois é ele que garante a
sobrevivência do plantador, claro.
Esse tipo de comemoração, então,
existe desde que o mundo é mundo. E o mundo é mundo, as we know it, há mais ou
menos 15 mil anos, quando a criação da agricultura. As técnicas de plantar e
colher surgiram primeiro no Oriente Médio. E foi lá, naturalmente, que a
humanidade teve suas primeiras festas agrícolas.
Uma delas segue viva até hoje:
você conhece como “Páscoa”. A coisa começou como uma comemoração de colheita,
há uns bons milhares de anos. Mas “recentemente”, por volta de 800 a .C., os israelitas
incluíram essa comemoração em suas tradições, e passaram a comemorar o Êxodo do
Egito, tradição fundadora da identidade judaica, na época dessa festa. Daí ela
ganhou seu nome atual (que veio de “Pesach”, “passagem” em hebraico). Depois,
os primeiros cristãos incluiriam a data em suas próprias tradições,
relacionando a data da ressurreição de Cristo à Páscoa.
Mas estamos falando aqui do Dia de Ação de Graças. E ele tem
tradições bem peculiares.
A raiz do Thanksgiving remonta a
Henrique 8º (1491-1547), o rei inglês que rompeu com a Igreja Católica, criando
uma Igreja para chamar de sua, a anglicana, que segue firme como a congregação
religiosa oficial da ilha.
Como o rompimento, Henrique 8º acabou
com uma série de feriados católicos. Para compensar, a Igreja anglicana criou
comemorações-tampão para colocar no lugar: os Dias de Jejum e os Dias de Ação
de Graças. Os de Ação de Graças ficaram relacionados às festas de colheita.
E foram religiosos ingleses
acostumados a celebrar essas festas de colheita/de Ação de Graças que começaram
a colonizar os EUA, a partir da costa leste, no início dos anos 1600.
A tradição americana diz que o
“primeiro Dia de Ação de Graças” em algum território que faça parte dos EUA
aconteceu em outubro de 1621, em Plymouth, no atual Massachusetts. É um
equívoco. Sabe-se hoje que houve uma série de celebrações de Ação de Graças nos
anos anteriores, principalmente na região do atual estado da Virgínia, que
também recebeu colonos britânicos bem cedo.
O de Plymouth, porém, ganhou aura
mitológica por ter reunido colonos britânicos e nativos americanos, da tribo
dos Wampanoags. As versões infantis da história dizem que os índios ensinaram
os colonos a plantar e caçar, e todos ficaram “amigos”. Fantasia pura.
O que houve entre colonos de
Plymouth e os Wampanoags foi uma aliança militar. A tribo sofria os efeitos de
uma praga, que dizimou boa parte de sua população, e começou a ser atacada por
tribos rivais. Os Wampanoags, porém, tinham um trunfo. Um de seus membros, um
sujeito chamado Squanto, já tinha sido escravo na Espanha e na Inglaterra – a
colonização das Américas, afinal, “é sobre” pilhagem, poder e escravidão lá no
Hemisfério Norte também.
Dada sua experiência prévia,
Squanto falava inglês. E quem se comunica, Chacrinha já dizia, não se trumbica.
Com Squanto fazendo o meio de campo linguístico, a chefia dos nativos entrou
num acordo com a dos colonos, e nasceu a aliança militar. Aliança que acabou
marcada pelo tal Dia de Ação de Graças multiétnico, com 90 Wampanoags e uns 50
britânicos – que eram de uma seita cristã radical, a dos Pilgrims (Pelegrinos),
mas essa é outra história.
O que importa é o seguinte: esse
dia de ação de graças (em letras minúsculas) comemorado entre cristãos e índios
se tornou o Dia de Ação de Graças com letra maiúscula. Um dia que não comemora
uma colheita, mas a própria colonização da América – e que só se tornou um
feriado oficial em 1863, no governo Lincoln.
Àquela altura, a população
indígena da costa leste já estava praticamente dizimada. A graça de um, afinal,
costuma ser a desgraça do outro.
(Do blog da revista
Super Interessante)
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