segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

O matuto e o coroné

Texto  e interpretação de Jessier Quirino*


Biu das Quengas, você será candidato! Só que você vai ser o laranja!

− Eu Coroné? Pergunta o Matuto.

− Você mesmo! Irá defender os meus interesses na campanha. Pedir votos cruzados, perturbar eleição, você será o laranja! Eu participo da eleição, eu ganho e você perde.

O Matuto disse:

− Coroné! Eu vou dizer um negócio ao senhor: Eu que sou um cabra “experimentado”, vivido e viajado nas beiras da postulança “political”. Eu vou lhe dizer um retaio de “sabença” que é a pronúncia mais “apronunciada” sobre política que ”inxiste” nesse mundo “selvageado” pelos animais, “vegetariado” e barrido pelas praias do coqueiro e aguado pelas ondas do mar. Além de sintoma prefeituroso, embocadura “deputadal”, cancha de guvernador e senador e sustância de presidente, o caba pra ser político no Brasil precisa do mini, minimoro dos seguintes adjuntorios, dois ponto:

Primeiro: começar juntar dinhero, pra depois cumeça juntar gente. Engolir muita rimunheta de cabra falso, feladaputista e pidão. Desatar nó cego da convenção. Escutar caqueado dificultoso de partidário que só tem um voto e olhe lá. Entrar em embuança de campanha. Prometer como sem falta e faltar como sem dúvida. Ficar refém da língua do povo. Pegar roleta de boca com camobembe. Fazer conchavo com reservista da ditadura. Desgaviar o caminho mode os quixó da oposição. Receitar pra mais de monte. Desmurmurar mulher falsa e coiseira. Acompanhar enrolamento de papel de justiça. Levar fama de ter esfrabicado moça donzela. Levar fama de ser corno, baitola e ladrão. Aguentar fazimento de pouco de eleitor desbriado. Botar tamanca pro opositor bom da peia. Bater quinhentos quibomgo com xangoseiro. Gritar aleluia em igreja pegue-e-pague. Alegrar sessão espírita. Assistir meia missa e sair comungado. Batizar minino feio com o nome de Desmenielirson Jerry. Dar de cumer do bom e cumer porcaria. Almoçar em lata de goiabada. Despronunciar discurso mal feito de candidato tabacudo. Aplaudir discurso desvirgulado, sem rumo e sem ponto final. Aturar converseiro duplicado de mesmo depois de banzeiro. Aturar gente furona e desconhecida dentro de casa. Viver rindo e fumaçando pelo fundo feito ferro de engomar. Acabar sua Devintezinha na buraquera. Aturar babões civis e militares. Botar no braço menino novo do fundo cagado. Tomar cerveja quente de espuma murcha. Tomar uísque Drures, sem gelo numa xícara de louça cum tira-gosto de canjica. Beber naquelas mesonas de imbuia, numa saleta escura e abafada, encostado numa cristalera e cercado de cabos eleitorais com cada suvaqueira de torar. Entregar taça de campeão a time safado. Chorar em velório de desconhecido. Escrever bilhete com lápis de ponta quebrada. Professorar as iniciais de nome de campanha pra eleitor tapado. Escorregar em lama de esgoto. Gritar: Oh de casa! em casa oca. Se abrir pra eleitor disabrido. Pagar cana pra pinguço desocupado. Farejar poeira de bunda em palanque. Levar dedada, no “cá pra nós”, quando tá nos braços do povo. Escutar destampatório de foguetão no pé do ouvido. Magoar o dedo mindim em passeata. Dormir chiquerado da mulher e dos filho. Apertar mão de cotó! Ganhar abraço fedorento. Receitar caixão de defunto e ambulança. Enfiar a mão em saco de dentadura pra distribuir com a mundiça. Comprar votos em dia de eleição. Estelionatar votos em boca de urna. Entrar em embuança de apuração. Dar cobro de voto roubado. Apertar a mão de traidor oportunista. Levar choque de microfone desencapado. Cair do palanque e sair todo ralado, mas rindo pro povo, desconfiado que nem cachorro que caiu do caminhão de mudança. E depois de eleito começar essa camubemagem toda de novo. Deus me livre de eu sair candidato. Chega me faltou suspiração e eu vou parar por aqui, porque a conversa de político é feito coceira, só quer um pezinho e eu não me candidato não, pronto e acabou-se!

*****

* Paraibano de Campina Grande, o poeta, músico, arquiteto, declamador, Jessier Quirino diz que não se considera um estudioso, apenas um “prestador de atenção”. Arquiteto por profissão, poeta por vocação e matuto por convicção, como ele mesmo se define, vive subindo nos palcos de todo país, para apresentar sua poesia declamada e os causos matutos.

 



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