A história consagrou as nove horas
(da noite) como a hora em que as pessoas deviam se recolher. Era a hora de
interromper uma visita, um jogo ou qualquer diversão e ir para casa. O Brasil
adotou esse costume, documentado em diversos textos, inclusive num poeminha
popular do século XIX:
“Nove hora! Nove hora!
Quem é de dentro, dentro,
Quem de fora, fora!”
Nessa época, o regulamento do serviço
policial do Rio de Janeiro e de outras cidades brasileiras tinha um dispositivo
advertindo que, depois das nove horas, “ninguém será isento de ser apalpado e
revistado”.
E foi nesse século que surgiu a
adjetivação cheio de nove horas para
o sujeitinho cheio de regras, de censuras e de limites às alegrias alheias.
(Do livro “A Casa da
Mãe Joana”, de Reinaldo Pimenta)
Luís da Câmara Cascudo (1898-1986),
pesquisador natalense que escreveu, entre muitos outros livros, “Locuções
tradicionais do Brasil”. Câmara Cascudo começa falando da importância que
antigamente, e por muito tempo, tinha na vida social – e não só na brasileira –
o limite das nove horas da noite, “a hora clássica do século XIX, regulando o
final das visitas, ditando o momento das despedidas”.
Qualquer um que teimasse em ficar na
rua depois disso poderia ser “apalpado e revistado” pela polícia, e “apenas os
boêmios, notívagos impenitentes, teimavam em afrontar os perigos da noite, da
polícia, dos ladrões e capoeiras esfaimados”.
Não se deve imaginar que o limite
estraga-prazeres das nove da noite tenha sido uma criação do século XIX. Câmara
Cascudo cita uma frase reveladora do escritor português seiscentista Francisco
Manuel de Melo: “Não dera ainda as nove horas, que é a taxa de todo cativeiro
do matrimônio!”. Tradução: o marido que não voltasse para casa às nove estaria
em apuros.
Uma figura foi criada nessa época,
era como um matrimonialista, cerimonialista que fazia questão de lembrar todas
as regras de conduta e impor limites aos outros. Era um controlador da vida dos
outros e dos pecados alheios. Essa figura era o “cheio de nove horas”.
Assim então surgiu tal expressão que
para nós significa uma pessoa chatinha, cheia de frescuras e manias.
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