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Catarina de Ataíde por Pedro Américo-1878
→ A notícia da morte de Dona
Catarina de Ataíde não chegou a Camões, segundo parece, senão por ocasião da
sua volta a Macau, onde tinha ido desempenhar uma missão de que o tinha
encarregado o governador das Índias, Francisco Barreto. Pouco depois de chegar
a Goa foi metido na cadeia, como se sabe; e foi durante o seu cativeiro que ele
chorou a morte de D. Catarina. Num soneto imitado de Petrarca compara-se a uma
ave privada da sua companheira, que ele tinha visto através das grades da
gaiola. Um outro soneto, em que se dirige à alma bem-aventurada daquela a quem
amava, é um dos trechos mais célebres da poesia portuguesa:
Alma minha gentil, que te
partiste
Tão cedo desta vida descontente,
Repousa lá no Céu eternamente,
E viva eu cá na terra sempre
triste.
.
Se lá no assento Etéreo, onde
subiste,
Memória desta vida se consente,
Não te esqueças daquele amor
ardente,
Que já nos olhos meus tão puro
viste.
.
E se vires que pode merecer-te
Alguma coisa a dor que me ficou
Da mágoa, sem remédio, de
perder-te,
.
Roga a Deus, que teus anos
encurtou,
Que tão cedo de cá me leve a
ver-te,
Quão cedo de meus olhos te levou.
Luís de Camões
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→ A morte da companheira do poeta
Filinto de Almeida, Júlia Lopes de Almeida (1862-1934) inspirou-o a elaborar
este belo soneto, que Alberto de oliveira leu aos seus confrades, numa sessão
da Academia Brasileira de Letras, depois de observar que os versos de Filinto
eram dignos de figurar ao lado dos de Camões a Catarina e de machado de Assis a
Carolina.
Dorme em meu coração, dorme
tranquila:
Enquanto ele bater, nele estarás;
E não te acorde a dor que me
aniquila,
Nem no ouças dizer-me: “Ela aqui
jaz”.
Esta, de que sou feito, humana
argila,
Por ti no sofrimento se compraz,
Orvalhando, com o pranto que
destila,
Meu Horto de Oliveiras... Dorme
em paz.
Dorme em paz, meu amor... Quero
embalar-te
Nestas cantigas de tristeza e dó.
Em bebidas de lágrimas sem arte.
E quando eu acabar, suplico só
Que a mim teus filhos venham
misturar-te
Nas mesmas cinzas e no mesmo pó.
Filinto de Almeida
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→ Carolina Augusta Xavier de
Novaes e Joaquim Maria Machado de Assis casaram-se no dia 12 de novembro de
1869 e viveram uma plácida e amorosa vida conjugal durante 35 anos. A morte da
esposa, em 1904, deixa Machado de Assis abatido e queixoso. Em 1906, o poeta
escreve “A Carolina”, seu mais pessoal e profundamente sofrido poema. O soneto
faz parte do livro “Relíquias de Casa Velha”, e foi o último escrito pelo
autor. Fontes: Folha Ilustrada de 22 de setembro de 2009 e “Toda Poesia de
Machado de Assis”, de Cláudio Murilo Leal.
Soneto “A Carolina” foi o último escrito por Machado de
Assis.
À Carolina
Querida, ao pé do leito
derradeiro
Em que descansas dessa longa vida,
Aqui venho e virei, pobre querida,
Trazer-te o coração do companheiro.
Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro
Que, a despeito de toda a humana lida,
Fez a nossa existência apetecida
E num recanto pôs um mundo inteiro.
Trago-te flores, − restos arrancados
Da terra que nos viu passar unidos
E ora mortos nos deixa e separados.
Que eu, se tenho nos olhos malferidos
Pensamentos de vida formulados,
São pensamentos idos e vividos.
Em que descansas dessa longa vida,
Aqui venho e virei, pobre querida,
Trazer-te o coração do companheiro.
Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro
Que, a despeito de toda a humana lida,
Fez a nossa existência apetecida
E num recanto pôs um mundo inteiro.
Trago-te flores, − restos arrancados
Da terra que nos viu passar unidos
E ora mortos nos deixa e separados.
Que eu, se tenho nos olhos malferidos
Pensamentos de vida formulados,
São pensamentos idos e vividos.
Machado de Assis
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