segunda-feira, 7 de março de 2022

O avesso do professor

 Jô Soares

Os professores que mais me marcaram foram exatamente aqueles que não foram bons professores os mais incompetentes. 

Por aí se pode ter uma medida da importância do professor, da delicadeza que é ensinar uma pessoa. Tive um de geografia, aos 11 anos, de quem eu jamais me esquecerei. Ele dava aulas como se estivesse fazendo uma conferência em uma faculdade. 

Começava dizendo “Hoje nós vamos falar do Brasil” e aí falava, falava e falava do Brasil. Depois dizia “Vamos falar da idade da Terra”, e blábláblá, só falava. Passava a aula de uma hora falando. Não nos dava a menor atenção. 

Por pura intuição, comecei a anotar o que ele falava. Fiz praticamente um caderno de geografia, aliás, vários cadernos, com aquilo que ele falava. Ele falava, eu ia tomando nota. Quando chegou a primeira prova − com 11 anos você não tem muita ideia do que está acontecendo − ninguém sabia nada. A única pessoa que tinha a matéria dada era eu. 

Os outros alunos perguntavam para ele “Mas, professor, como é que eu estudo isso?”. E ele falava “Nos livros, nos livros”. Resolvi passar os meus cadernos para que os outros também pudessem estudar. Só muitos anos depois foi que percebi que aquilo era uma maneira de dar aula muito mais adulta do que deveria ser para um menino de 11 anos. 

Outro tipo de professor que me marcou muito foi aquele que guarda o conhecimento como se fosse uma ciência oculta, que tem o poder porque sabe e você não sabe. É o professor que tem o gosto de não ensinar o aluno. Foi com esse tipo que, pela primeira vez, eu tomei consciência de que o conhecimento é poder, que a informação é poder, porque ele dominava a classe através disso. 

Parece um paradoxo, mas é quase como se ele dissesse “Eu não estou aqui para ensinar vocês”, um recado totalmente errado, que ele nos passava inconscientemente. 

Graças a Deus, a grande maioria dos professores que eu tive se dedicavam ao ensino. Professores como o de história do Colégio São Bento, quando eu tinha 8 anos, o professor Mesquita, que dava suas aulas desenhando histórias em quadrinho no quadro negro. Ele entrava no teu mundo para te ensinar. E todos nós éramos ótimos em história. 

 

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