quarta-feira, 9 de março de 2022

Aos alunos, com carinho

 Jéferson Tenório

Às vezes, quando me pedem conselhos para se tornar escritor, respondo: seja um professor de escola pública do ensino básico. Eu sei que nem todo mundo que quer escrever tem talento para o magistério, mas seria bom. Uma sala de aula com crianças e pré-adolescentes lhe prepara não só para a literatura, mas também para a vida. Experimente passar duas horas por dia dando aula para um sexto ano. Sua visão de como resolver conflitos e enredos vai mudar radicalmente. Acredite. 

Lecionar lhe ensina a não guardar mágoas, porque um professor tem tudo para ser um ressentido, mas não é. Um professor aprende a perdoar aquelas situações mais irritantes: perdoa quando é interrompido cinco vezes por conversas paralelas no meio da explicação. Perdoa quando ainda na mesma explicação sobre redação alguém levanta a mão e faz uma pergunta aleatória: “Professor, quantos anos o senhor tem?”. 

Perdoa quando você está no seu melhor momento explicando a guerra na Ucrânia e um aluno levanta a mão efusivamente e você acha que ele fará um comentário ou tratará de uma questão que os levará a um patamar mais profundo da discussão, mas não. Era só para perguntar se pode ir ao banheiro mesmo. 

Sim, os professores são duros na queda porque eles perdoam aquela volta do recreio, com os alunos suados e agitados e aquele jeito de “ninguém está interessado na sua aula sobre tempos verbais, professor”. Perdoa quando os alunos querem tirar dúvidas sobre o conteúdo no meio de uma avaliação, mesmo que você tenha feito 438 revisões antes da prova, mas ninguém estava prestando atenção. 

Os professores perdoam porque os alunos também sabem perdoar nossas falhas. E há momentos bonitos quando os alunos acreditam no que estamos dizendo, mesmo quando não estamos bem. E essa é a mágica da educação: quando os conhecimentos entre vocês se conciliam. Quando vocês se percebem. 

Colegas, não se enganem: alunos são especialistas em professores. Eles estão lá, todos dias, lhe observando. E reconhecem quando um professor é bom. Reconhecem, do jeito deles, mas reconhecem. A sala de aula é literatura. 

(Texto de Zero Hora, março de 2022)

* Como professor de 8ª séries (agora é 9ª) do primeiro grau, que equivalia ao antigo 4° ginasial, ano que eu lecionei, muitos anos, em uma escola do Município de Porto Alegre, RS, posso avaliar a veracidade desta bela crônica do escritor Jeferson Tenório. 

(NSM)


Escola Municipal de Ensino Fundamental Senador Alberto Pasqualini

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