Sam Walter Foss
Um dia, através da floresta virgem,
um bezerro emigrou para o seu curral distante, a exemplo dos bons bezerros.
Mas fez uma
picada sinuosa, corcoveada, a exemplo de todos os bezerros.
Trezentos
anos escoaram-se desde então, e deduzo que o bezerro esteja morto.
Mas atrás de
si ele deixou seu rasto, e nisto se estriba a moral de meu conto.
Seu rasto foi seguido, no dia
seguinte, por um cão vagabundo, que percorreu a mesma trilha.
E depois, um prudente carneiro-guia
seguiu-o por vales e montes.
E, após si,
conduziu todo o rebanho, a exemplo também de todos os bons guias.
E desde esse dia, por sobre outeiros
e planícies, foi-se abrindo um caminho através daquela vetusta floresta.
Muitos homens molestavam-se por
dentro e por fora, esquivam-se, voltavam e perambulavam.
E proferiram palavras de justa
indignação, por causa de tão sinuoso caminho.
Mas, ainda assim, continuavam repetindo
– não se ria! – a primeira emigração do bezerro.
E por este caminho, sáfaro e
encaracolado, eles andavam lentos, cambaleantes e trôpegos...
O caminho da floresta tornou-se uma
alameda, que se encurva, dobra e redobra.
A tortuosa alameda transformou-se
numa estrada, onde muitos pobres cavalos, arqueados sob pesadas cargas,
troteavam penando ao sol ardente e andavam três milhas para avançar uma.
E, assim, durante um século e meio,
todos seguiram as pegadas do bezerro.
Os anos passaram em célere voo, e a
estrada converteu-se numa viela de aldeia.
E sem que os homens o percebessem, a
viela metamorfoseou numa movimentada via pública de cidade.
E, logo se erigiu em rua central de
uma famosa metrópole.
E durante dois séculos e meio têm os
seres humanos se submetido às pegadas do bezerro.
Dia a dia, centenas de milhares de
homens repetem o mesmo ziguezague do bezerro.
E por esta corvoveada trajetória,
desde então, deu-se o tráfego de um continente.
Centenas de milhares de homens se hão
orientado por um bezerro morto há quase três séculos.
E ainda seguem seu saracoteado
trajeto, e em cada dia perdem uma centena de anos.
Pois tal e tanta é a reverência que
tributam a um precedente estabelecido.
Uma lição de moral isto poderia
ensinar, fosse eu um pregador ordenado, pois os homens se inclinam a seguir
cegamente o caminho do bezerro imaginado.
E trabalham a morrer, de sol a sol,
no afã de imitar o que os outros fizeram.
Só palmilham pista já batida. E
oscilando para dentro e para fora, para diante e para trás.
Seu tortuoso curso seguem sempre,
para conservar o trajeto iniciado por outros.
Fazem do caminho uma rota sagrada,
pela qual se movimentam durante toda a vida.
E como deles riem os antigos deuses
da floresta, que testemunharam o andar incerto do bezerro primevo!
Ah! Quantas coisas poderia esta
história ensinar... mas não fui ordenado pregador.
Sam Walter Foss – bibliotecário
e poeta americano
(19.06.1858 – 26.02.1911)
(19.06.1858 – 26.02.1911)
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