Quando olhei para o mar e divisei, ao longe, o nada na linha do horizonte, meu corpo estremeceu, meus pensamentos se embaralharam. Fui tomado por um certo pavor, por uma indecisão. Afinal, eu estava deixando toda a minha vida para trás: os meus pais, os meus amigos, amores de adolescência, as conversas na praça, os passeios após a missa.
Senti uma dor muito forte no peito, minha boca ficou seca e o suor umedeceu as mãos.
Agarrei-me a alguma coisa no navio. Baixei a cabeça, procurei respirar fundo, e arrisquei: mais uma vez olhei para a imensidão das águas, tentei equilibrar-me colocando as mãos nos bolsos do meu casaco puído, mantive-me firme, parecia querer assumir uma posição de orgulho e desafio.
Por alguns instantes, vieram-me à mente coisas que aprendera no pouco tempo em que estive na escola. Lembrei dos heróis da minha terra, recordei a luta do meu povo, a esperança de uma vida melhor jamais abandonada pela minha nona.
E comecei a sentir um vigor, uma força, uma convicção: Sim, eu iria para o Brasil, iria enfrentar o desconhecido, iria deixar tudo para trás. Com o meu suor, com o meu empenho, construiria uma nova vida. Não, não importavam os sofrimentos e os percalços que poderiam ocorrer. Eu honraria minhas origens. Eu seria o filho de Amabile e de Domenico.
Certamente, não enfrentei nem mais nem menos do que os meus compatriotas. Fui explorado, queriam que eu trabalhasse como um escravo; fui enganado, recebi montanhas pedregosas por vales verdejantes; fiquei doente, quase morri. Trabalhei como um insano. Mas jamais desisti.
E hoje, abraçando os meus netos, não deixo de achar tudo muito interessante. Venci, superei obstáculos. E, o mais importante, sou um homem com uma emoção que poucos podem sentir: Amor por duas pátrias.
(Giovanni Tuigo)
Poema aos italianos:
“Oração dos descendentes”
Senhor
Deus,
Protetor dos mais fracos
Sofredores e oprimidos,
Obrigado por ter guardado
Os nossos antepassados queridos…
Que
vieram da terra nostra
Tão querida e distante,
Buscar desse lado do oceano
Um novo Horizonte…
Plantando
belas flores
Num jardim abandonado,
Dando
vida a tantos campos
Onde o sofrimento foi enterrado…
Essa gente tão diferente
Com vozes altas e cantaroladas,
Escondia dentro do peito
As feridas nunca cicatrizadas…
Assim
o tempo foi passando
Como moinho moendo lembranças,
Naqueles rostos escorria o suor
Transformado em esperanças…
A
luta incansável do dia a dia
Embaixo do sol e da chuva,
Os pés que sustentavam o corpo
Também amassavam a uva…
Para
fazer o santo vinho
Que afogava as tristes mágoas,
Trazidas pelos navios
Fazendo riscos nas águas…
Hoje
nós fazemos de volta
Aquele incerto roteiro,
Com a mesma coragem
Daqueles bravos guerreiros…
Que
nos dão tanto orgulho
Há muitos e muitos anos,
Que Deus abençoe a todos
Descendentes de italianos.
Por Braz Gardini, ítalo-brasileiro, poeta e escritor. É autor também de “Ser italiano é...”.
Apaixonado pelas coisas da Itália, ele contribui com belos textos para os descendentes de italianos.
(Do blog Italianismo)
Nenhum comentário:
Postar um comentário