sexta-feira, 5 de novembro de 2021

Ser idoso ou ser um velho

 Jocardo*

Idosa é a pessoa que tem muita idade; Velha é a pessoa que perdeu a jovialidade. A idade causa a degenerescência das células; a velhice causa a degenerescência do espírito. Por isso, nem todo idoso é velho e há velho que ainda nem chegou a ser idoso.

O mesmo acontece com as coisas: há coisas que são “idosas” (antigas) e há coisas que são velhas. Um vaso da Dinastia Ming (1368-1644) pode ser uma antiguidade, uma relíquia que não tenha preço; um outro, de apenas uns 50 anos ou menos, pode ser um vaso velho, relegado a um depósito. 

Você é idoso quando pergunta se vale a pena; você é velho quando sem pensar responde que não. Você é idoso quando está pronto a correr riscos; você é velho quando procura correr dos riscos. Você é idoso quando sonha; você é velho quando apenas dorme. Você é idoso quando ainda aprende; você é velho quando já nem ensina. Você é idoso quando pratica esportes ou de alguma outra forma se exercita; você é velho quando apenas descansa. Você é idoso quando ainda sente Amor; você é velho quando só sente ciúmes e possessividade. Você é idoso quando o dia de hoje é o primeiro do resto de sua vida; você é velho quando todos os dias parecem o último da longa jornada. Você é idoso quando seu calendário tem amanhãs; você é velho quando seu calendário só tem ontens.

O idoso é aquela pessoa que tem tido a felicidade de viver uma longa vida produtiva, de ter adquirido uma grande experiência; ele é uma ponte entre o passado e o presente, como o jovem é uma ponte entre o presente e o futuro e é no presente que os dois se encontram. O velho é aquele que tem carregado o peso dos anos, que em vez de transmitir experiência às gerações vindouras, transmite pessimismo e desilusão. Para ele, não existe ponte entre o passado e o presente, existe um fosso que o separa do presente pelo apego ao passado. 

O idoso se renova a cada dia que começa; o velho se acaba a cada noite que termina, pois enquanto o idoso tem seus olhos postos no horizonte de onde o sol desponta e a esperança se ilumina, o velho tem sua miopia voltada para os tempos que passaram. O idoso tem planos, o velho tem saudades. O idoso curte o que lhe resta de vida; o velho sofre o que o aproxima da morte. O idoso se moderniza, dialoga com a juventude, procura compreender os novos tempos; o velho se emperra no seu tempo, se fecha em sua ostra e recusa a modernidade. 

O idoso leva uma vida ativa, plena de projetos e prenhe de esperanças. Para ele, o tempo passa rápido, mas a velhice nunca chega. O velho cochila no vazio de sua vidinha e suas horas se arrastam destituídas de sentido. As rugas do idoso são bonitas porque foram marcadas pelo sorriso; as rugas do velho são feias porque foram vincadas pela amargura. 

Em suma, idoso e velho, duas pessoas que até podem ter a mesma idade no cartório, mas têm idades bem diferentes no coração. 

Sou idoso (tenho quase 70 anos)**, mas espero que nunca fique velho. 

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*   Jorge José de Jesus Ricardo (Jocardo) ‒ Balneário Camboriú-SC 

** Idade da época que escreveu a crônica. 

Artigo vencedor do 1° Concurso Literário para a Terceira Idade, promovido pela UDESC-Universidade do Estado de Santa Catarina, Fundação Viva Vida e Conselho Nacional do Idoso, e publicado no livro “Poesias Contos Crônicas” ‒ Editora da UDESC-Florianópolis-1996, pág.243-244.

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