terça-feira, 30 de março de 2021

A música e as suas décadas

 

Década de 30 

Ele, de terno cinza e chapéu panamá, em frente à vila onde ela mora, canta: 

“Tu és, divina e graciosa, estátua majestosa!

Do amor por Deus esculturada.

És formada com o ardor

da alma da mais linda flor, de mais ativo olor,

que na vida é a preferida pelo beija-flor...” 

Década de 40 

Ele escreve para a Rádio Nacional e manda oferecer a ela uma linda música: 

“A deusa da minha rua,

tem os olhos onde a lua,

costuma se embriagar.

Nos seus olhos eu suponho,

que o sol num dourado sonho,

vai claridade buscar...” 

Década de 50 

Ele pede ao cantor da boate que ofereça a ela uma canção da Bossa Nova: 

“Olha que coisa mais linda,

mais cheia de graça.

É ela a menina que vem e que passa,

no doce balanço a caminho do mar.

Moça do corpo dourado,

do sol de Ipanema.

O teu balançado é mais que um poema.

É a coisa mais linda que eu já vi passar.” 

Década de 60 

Ele aparece na casa dela com um compacto simples embaixo do braço e coloca na vitrola uma música papo-firme: 

“Nem mesmo o céu, nem as estrelas,

nem mesmo o mar e o infinito

não é maior que o meu amor,

nem mais bonito.

Me desespero a procurar alguma forma de lhe falar,

como é grande o meu amor por você...” 

Década de 70 

Ele chega em seu fusca, abre a porta pra mina entrar e bota uma melô joia no toca-fitas:

“Foi assim, como ver o mar,

a primeira vez que

os meus olhos se viram no teu olhar....

Quando eu mergulhei no azul do mar,

sabia que era amor e vinha pra ficar...” 

Década de 80 

Ele telefona pra ela e deixa rolar um: 

“Fonte de mel, nos olhos de gueixa,

Kabuki, máscara.

Choque entre o azul e o cacho de acácias,

luz das acácias,

você é mãe do sol.

Linda...” 

Década de 90 

Ele liga pra ela e deixa gravada uma música na secretária-eletrônica: 

“Bem que se quis,

depois de tudo ainda ser feliz.

Mas já não há caminhos pra voltar.

E o que é que a vida fez da nossa vida?

O que é que a gente não faz por amor?” 

Em 2000 

Ele captura na Internet um batidão legal e manda pra ela, por e-mail: 

“Tchutchuca!

Vem aqui com o teu Tigrão.

Vou te jogar na cama e te dar muita pressão!

Eu vou passar cerol na mão,

vou sim, vou sim!

Eu vou te cortar na mão!

Vou sim, vou sim!

Vou aparar pela rabiola!

Vou sim, vou sim!”


Onde foi que nós erramos? 

Será que ainda é possível piorar? 

Pois não é que piorou! 

“Hoje é festa , lá no meu apê , pode aparecê , vai rolar bunda-lelê!”

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