sábado, 20 de março de 2021

Humor de Paula Nei

 

Quando foi proclamada a República, Paula Nei, cheio dos paus*, estava na sacada do jornal Gazeta de Notícias, junto com outras personalidades. Do povo aglomerado embaixo, começaram os apelos: “Fala Nei, fala Nei”. Cambaleando, Paula Nei avança para pronunciar o discurso, tropeça e é amparado por um oficial do Exército. Profético, anuncia: “Concidadãos! O povo amparado pelo Exército: eis a República”. 

*Embriagado 

(Em Cabeças-chatas, de Leonardo Mota) 

Na aula de Química, o professor pergunta:

– Conhece alguma aplicação da água, senhor Paula Nei.

– Dizem que serve para beber. 

De uma feita, ao cabo de libações com os colegas, Paula Nei abandonou-os, mas, sentou-se exausto, num vão de porta, à Rua Gonçalves Dias. Um amigo passou, sacudiu-o:

– Que fazes aqui, Paula Nei.

– Espero o bonde.

– Mas aqui não passa bonde.

– Você sabe lá o futuro?… 

O incorrigível e adorável boêmio Paula Nei entrou num restaurante barato. Pediu a lista. Dando-lha, o caixeiro postara-se-lhe ao lado. E Nei, calado.

– O que vai?

– Traga-me uns erros de ortografia.

– Cá não há disso, meu senhor.

– Mas a carta está cheia deles… 

Estava Paula Nei parado numa esquina da Rua do Ouvidor, quando um cavalheiro seu conhecido aproximou-se esbaforido, e indagou-lhe:

– Ó Nei! Você não viu passar por aqui agora mesmo, um rapazote, gordote, baixote, morenote?…

E o Paula Nei:

– Não vióte! 

Na Escola de Medicina, o aluno Paula Nei era arguido pelo lente de obstetrícia, apresentando-lhe todas as dificuldades que podem surgir num parto complicado. Enquanto pode, Paula Nei foi resolvendo: faria isto, faria aquilo, etc… Veio, porém um caso tão intrincado que, não sabendo mais o que dizer, ele respondeu:

– Num caso desses, eu mandava, a toda pressa, chamar V. Exª… 

Guimarães Passos e Paula Nei estavam com fome, e este saiu para comprar algo de comer. Voltou com uma garrafa de pinga e um pãozinho menor que a mão. E o Guima reclamou:

– Nei, para que tanto pão? 

Época de provas. Como sempre a sala cheia, e galerias também, pois quando Paula Nei ia fazer provas ninguém queria perder o espetáculo, pois sabia-se que ia sair alguma “blague”. 

− O professor, o Visconde de Saboia, chamou Paula Nei, e mandou que ele retirasse o ponto, a fim de que ele dissertasse sobre a matéria. Paula Nei levantou-se, foi na banca examinadora e retirou o ponto. Abriu-o e viu logo que estava fraquíssimo naquela matéria. Verbo fácil, invejável dicção, começou: 

− “Nos mares procelosos da ciência humana, às vezes as mais lúcidas inteligências se debatem e vão ao fundo...” 

Aí, o Visconde de Saboia, interrompeu-o e perguntou-lhe: 

− Senhor Paula Nei, já que o Senhor quer fazer dissertação literária extra-ponto, diga-me uma coisa, e faça-me o favor de dizer o que seria da ignorância se a inteligência naufraga? 

Rápido como um relâmpago, Pauta Nei, fulminou o professor com essa resposta à queima roupa: 

− ESSA BOIA, senhor Visconde! 

O professor, Visconde de Saboia, deu-lhe um tremendo 0, e mandou-o retirar-se da sala, enquanto explodia pela sala uma tremenda gargalhada de todos os presentes...

Francisco de Paula Nei foi poeta e jornalista brasileiro. Nasceu no Estado do Ceará, na cidade de Aracati, a 2 de fevereiro de 1858. Publicou com Coelho Netto e Pardal Mallet − o “Meio social, político, literário e artístico” em 1889. Ele marcou a boêmia do Rio de Janeiro da belle époque. Era amigo de Aluísio Azevedo, Coelho neto, Olavo Bilac e José do Patrocínio. Faleceu no Rio de Janeiro a 13 de outubro de 1897.

Nenhum comentário:

Postar um comentário