sexta-feira, 17 de abril de 2020

História completa como ocorreu a operação de resgate

do ex-governador Leonel de Moura Brizola
 do Território Brasileiro.


Brizola permaneceu quase um mês na clandestinidade em solo gaúcho, mesmo sendo perseguido, o seu primeiro refúgio foi numa fazenda situada perto da capital.

Uma semana após, viajou à noite com a esposa Neusa e os três filhos para Porto alegre, indo para casa de um amigo situado a rua Eça de Queiroz, no bairro Petrópolis, depois disso, se refugiou em diversas residências de amigos e políticos.

Brizola se encontrava em Porto Alegre, mas sem condições de sair do país, pois as buscas, a “caça ao Brizola”, se intensificaram, tendo a sua residência à rua Tobias da Silva, n° 66, sido invadida e depredada pelas forças de repressão.

Toda a informação dava conta que os militares o prenderiam. Não havia outra alternativa senão o exílio, afirmava Brizola, pediu, então, aos seus amigos que levassem Neusa e os filhos para Montevidéu.

Dessa forma, Brizola acabou se refugiando no apartamento do grande amigo, ex-vice-prefeito de Porto Alegre, o renomado advogado Ajadil de Lemos, o apartamento localizado à rua Duque de Caxias, a uma quadra do Palácio Piratini.

Manoel Soares Leães, (mais conhecido por Maneco), conta que em fins de abril de 1964, quando acompanhava o ex-presidente João Goulart, comentou sobre o desejo de Brizola sair do Brasil.

Maneco recebeu no seu apartamento, à rua Bulevar España esquina com La Rambla, barrio de Pocitos, um emissário que lhe propôs a missão de resgatar o ex-governador Brizola. Durante dez dias estudou a possibilidade de fazer o resgate em Porto Alegre, por achar muito arriscado a melhor alternativa seria realizá-lo no litoral gaúcho. Solicitou, então, ao emissário que fosse analisado os movimentos das marés “alta e baixa”, com areia firme, faria um pouso com segurança. Para tal, deveriam estar na praia um caminhão e dois carros, posicionados no formato de uma “cruz”. Esse seria o sinal de que o plano de resgate não havia sido descoberto. Maneco, então, rasgou uma nota de um cruzeiro ao meio, ficando com uma metade, a outra metade ser-lhe-ia entregue pelo emissário que traria o plano de resgate de Brizola.

O deputado Hélio Fontoura, veranista de Cidreira, ficou encarregado de analisar o melhor horário para Maneco pousar e realizar o resgate. Deveria ser entre 7h30min e 8 horas da manhã, horário em que areia estaria firme.

Coube à dona Lenira, esposa de Ajadil de Lemos, levar Brizola para o litoral.

Na madrugada do dia 15 de abril de 1964, saíram da garagem do prédio, na Avenida Duque de Caxias, no Wolkswagen verde dirigido por dona Lenira. Brizola estava vestido com a farda e o capacete branco da Brigada Militar, cedido pelo Coronel Atílio Escobar, ex-Chefe da Casa Militar, que retirou as estrelas das fitas dos ombros. Brizola entra no Wolkswagen com mais duas pessoas, sentando-se no banco traseiro, seguiram em direção ao litoral gaúcho.

Ao se aproximarem de Águas Claras, havia uma blitz, foram momentos dramáticos. Brizola falou: preciso manter a calma. “Se eu for reconhecido serei preso e morto.” O veículo foi parado por soldados militares, dona Lenira, ao abrir a janela do carro, o soldado olhou para o interior do fusca, Brizola executou a continência, tocou o seu chapéu com as pontas dos dedos e o soldado, nem pediu os documentos, mandando-os passar. E assim seguiram viagem para a praia de Cidreira, até o local do resgate, onde ficariam aguardando a chegada de Manoel Leães, o “Maneco”.

Passados alguns dias do resgate, fui chamado a comparecer no hotel Lancaster, no centro de Montevidéu, onde dona Neusa e os seus filhos estavam hospedados, já sabendo que seria, peguei o carro de Jango e fui o mais rápido possível ao hotel. Ao chegar lá, Neusa e o emissário Ajadil de Lemos estavam à minha espera, com ele, a outra metade de um cruzeiro e com o plano de resgate.

Um dia antes, havia comentado com a minha esposa, que viajaria ao interior uruguaio, para receber as cabeças de gado que Jango havia comprado e iria despachar para a fazenda El Rincón, Departamento de Tacuarembó. Na madrugada do dia seguinte, peguei a minha família e fomos para Punta del Este, era preciso ludibriar os agentes que nos vigiavam. Orientei, então, a minha esposa, Odila, que, caso eu não retornar até o fim da tarde, ela deveria voltar para Montevidéu e entrar em contado com Jango.

Às 5 horas do dia seguinte, decolei do aeroporto de Punta del Este totalmente às escuras. Fui para o interior uruguaio. Era preciso enganar os agentes, e teria que chegar à praia de Cidreira entre 7h30min e 8 horas. Em 15/04/1964, Maneco Leães, pilotando o Cessna 310 bimotores azul e branco prefixo PT-BSP, levantei voo clandestinamente do aeroporto de Acuhel, cidade do interior uruguaio, ao decolar sintonizei no VOR a rádio Guaíba e, durante o voo, ouvi uma entrevista de uma autoridade do governo comentando que em poucas horas o ex-governador Leonel Brizola estaria preso.

Cheguei a pensar que seriam dois os presos! Para não ser percebido pelos radares, vinha voando baixo, pouco mais que um metro acima das ondas do mar. Ao aproximar-me do litoral, fui para a praia de Cidreira-RS. Ao avistar o sinal, notei que o plano não correspondia ao que havia sido combinado: estava faltando um carro. Pensei em retornar, que o plano havia sido descoberto. Mesmo assim resolvi sobrevoar a praia, quando avistei o Brizola saindo de trás dos cômoros (dunas) de areia com o capacete branco na mão abanando e vestido com a farda da Gloriosa Brigada Militar do Rio Grande do Sul, farda emprestada pelo coronel Atilio Escobar.

Pousei na beira da praia e nem desliguei os motores, abri a porta do avião, enquanto Brizola entrava e fechava a porta. Já estava decolando e voando baixo em direção ao Uruguai. Durante o retorno, o Brizola perguntou: − “Maneco, olha para trás e vê se não vem vindo algum avião da FAB?” Eu tranquilizei-o: − “Não há mais perigo de sermos interceptados, já estamos perto da fronteira”. Pouco depois, ultrapassamos a fronteira, saindo do território brasileiro, anunciei ao Brizola que já estávamos no espaço aéreo uruguaio! Ele apertou a minha mão e agradeceu: − “Obrigado, Maneco”! Posei na cidade de Sarandi Grande a 150 km de Montevidéu, início do seu exílio!

Esta foi a última operação de Manoel Soares Leães o “Maneco” em solo brasileiro. Brizola parecia aliviado, porque iria encontrar-se com a sua família. A viagem terminou em Solymar, um balneário nos arredores de Montevidéu, onde o ex-Presidente João Goulart o esperava.

*****

Quinze anos depois, o mesmo Maneco Leães iria buscar Brizola em Assunção, no Paraguai, no dia 07/09/1979, às 7h30min, a bordo do avião Sêneca prefixo PT-ESO, propriedade de João Vicente Goulart, levando Brizola e a sua comitiva com destino a São Borja-RS. As 09h30min, pousa o avião na pista da Granja São Vicente de propriedade do ex-Presidente João Goulart.


Mais de 30 mil pessoas o esperavam. Com Maneco desembarcaram Neusa e os seus filhos, Sereno Chaise, Wilson Vargas e Pedro Simon, encerrando o seu exílio.

Brizola teve que subir na capota de uma Kombi, para poder vencer a multidão que queria tocá-lo, acenando para o povo são-borjense.

Manoel Laquito Barbisan Leães

O piloto: Manoel (Maneco) Soares Leães*

*Uruguaiana-RS: 28.01.1923 − Porto Alegre-RS: 07.08.2001

Cessna 310 bimotores azul e branco prefixo PT-BSP,
O avião do resgate do governador Leonel Brizola.

Nenhum comentário:

Postar um comentário