sábado, 25 de maio de 2019

Nestor Barbosa, um personagem de Porto Alegre.



Um amigo descobriu uma foto de Nestor ainda meninote e, sem o médico saber, foi à Livraria do Globo, combinando com um dos Bertaso publicá-la na Revista do Globo, na seção de registros sociais. Afinal, assim saiu no nº 257 da revista, de 22-8-1939, como se o “interessante e ganancioso menino” não fosse, na ocasião, um homem de quase quarenta anos.

Médico radiologista de renome, bondoso, culto, estimadíssimo pelos amigos e familiares, o Dr. Nestor Barbosa, além de tudo, possuía características bem marcantes: era um grande brincalhão. Tinha como passatempo predileto pregar peças, a cuja montagem dedicava-se com método e paciência, demonstrando sempre inteligência criativa e capacidade de pressentir as reações das pessoas.

Foi, seguramente, o maior trotista telefônico que a cidade conheceu. Mais episódios seus talvez não sejam conhecidos justamente porque buscava, quando possível, o anonimato. Mantinha concorrido instituto de radiologia na sobreloja da galeria Chaves, cujas janelas davam frente par a Rua da Praia.

Em determinada época, antes da Segunda Guerra Mundial, o médico ligava, sempre no meio da tarde, para o velho Costa Dias, português amável, mas exaltado, dono de bem sortido e movimentado armazém na esquina da Rua de Bragança (hoje Marechal Floriano) com Jerônimo Coelho. O comerciante atendia e Nestor, variando a voz, questionava sobre o estoque, demonstrando intenção de compras volumosas; até que, depois de alguns rodeios cada dia mais sofisticados, terminava perguntando se o seu Costa tinha, ou se já chegara, aquela linguiça crioula, bem grossa, especial. O português, zonzo com grande movimento daquela hora, sistematicamente e desavisadamente caía no logro, respondendo que tinha, sim, ou que recebera.

− Então enfia no cu − dizia Nestor. E desligava.

Assim era todos os dias.

No instituto de radiologia, todo fim de tarde, costumavam encontrar-se, nas horas de folga, os médicos da galeria. Numa dessas reuniões, Nestor foi aos poucos dirigindo o papo para os bons fornecedores de carne para churrasco. Conversa vai, conversa vem, confidenciou a um colega presente que a melhor linguiça da cidade era uma crioula, bem grossa, fornecida pelo armazém do Costa Dias. Como o outro demonstrasse interesse em comprá-la, Nestor recomendou-lhe que telefonasse em hora de pouco movimento e falasse com o próprio português, identificando-se antes, pois a freguesia da linguiça era selecionada.

O companheiro agiu exatamente como o sugerido e, sem entender nada, levou tremenda descompostura...

(Do livro “Anedotário da Rua da Praia 1”
de Renato Maciel de Sá Júnior) 

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