quarta-feira, 8 de maio de 2019

O Lubisômi*

Autor: Nhô Bento


Fiquemo um tempão ali se namorando...
Eu oiando bem nele, ele me oiando...
Rezei um oração, num diantô...
Fiz o pelo siná, ele afastô,
Mas eu errei, num fiz co a mão direita
E o coisa ruim vortô.

Mas aí eu fiquei com mais corage.
Me deu reiva, eu num corro da bobage...
ranquei da cinta minha garrucha
E gritei: Ocê imbucha ou desimbucha?

Engatiei, puchei. Quá tiro nada.
A garrucha intupiu... No desespero,
Eu tremia quiném um maleitero
Pru que o Lúcifer ficou valente
Que nem leão... e estralava os dente
Mais brabo inté do que quarqué quexada.

Ele dava pulo assim, deste tamanho
Pra me livra dos dente do Diánho...
Uma hora que ele quis me atarraca,
Minha potranca azulô no matagá
E me dexô sozinho com o ladrão.

Gramei cô tá um pedacinho duro...
Inté que eu gritei pra ele: Te escunjuro!
Seja quem for, suma pros Quinto já!

Aí ele murchô, garrô a uiva,
Triste que retaiava o coração de gente.
Quando parou de uivá... dava dó vê..
Ele oiô pra eu, cumo quem diz: Ocê...
Pruquê me escunjurô? Minha sorte é esta,
Coitado! Eu sei que escunjurá num presta...
Mas só fazendo ansim ficava em paz...

Deus que me perdoe, mas se escunjurando, errei...
Mas afinar, num fui eu que provoquei.

Despois ele me oiô muito sentido
Cumo arguém quando fica arrependido...
Entrou dentro do mato e eu num vi ele mais.
Bão... eu vim vindo a pé...
vinha pensando o causo que passô
quando ascancei o sitio do Dotô
topei com meu cumpade Zé Correia...

Contei o causo pra ele, contei tudo...
Ele escuitava e tal... mas tava mudo,
Maginando decerto que eu mentia...
Eu que num minto e sei o que dizia.
Fui ficando com as purga atrás da orêia.

Inté que eu catuquei: − Cumé? Mecê duvida?
Ele me disse: − É, pode ser...
Pode ser não ora essa... pois eu vi.
Eu que tava queimado, ai xinguei
a assombração de tudos nome.

Quando oiei pro cumpade, ele chorava...
Dava dó vê como saluçava.
Aí é que eu percebi. Quá... em essa vida
Há de ter sempre história assim doída.
história que mar consomi...
Era ele, o cumpade Zé Correia... o Lobisomi!

*****

Esse texto está na internet declamado por Rolando Boldrin.

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