Fabino era um soldado bajulador.
Todos o detestavam por isso. Ficava sempre perto do comandante, tentando
adivinhar do que ele precisava, o que ele queria, para que ele, Fabino, pudesse
providenciar. Esse comportamento seria aceitável se ele não colocasse os
colegas em apuros sempre que podia, para se promover junto ao comandante. E aí
veio o acampamento. Fabino conseguiu, usando o nome do comandante, que sua
barraca ficasse junto a dele de modo a poder atendê-lo mais prontamente. E
ouviu o comandante dizer que precisava de dez folhas de cartolina, de diversas
cores, para uma exposição que faria aos oficiais e sargentos, naquela tarde.
Fabino sabia que seria impossível, naquele mato, conseguir o papel, mas logo se
apresentou para cumprir a missão e conseguir realizar a proeza. Como, ele
descobriria mais tarde. O importante era agradar o comandante.
Saiu então em busca de um motorista e
de um jeep, sempre falando em nome do seu chefe. Conseguiu. O soldado falou que
não guiava bem, que o jeep não estava funcionando direito e que não conhecia
nada daquela região. Fabino ignorou a ojeriza demonstrada pelo soldado e disse
que era ordem do comandante e partiram.
Se embarafustaram por estradinhas e
estradas “projetadas”, até alcançar uma rodovia de verdade. Fabino escolheu uma
direção e rumaram pra lá. Deveria haver uma vila, uma cidade, onde pudesse
comprar o papel. Acharam a pequena vila um bom tempo depois de rodarem pela
estrada e Fabino começou a ter dúvidas se saberia voltar ao acampamento.
Conseguiu achar um armarinho e lá comprou as folhas de cartolina, de cores
variadas. Dispensando que fossem embrulhadas, pulou para jeep e mandou que o motorista
pisasse fundo. Mal retomaram a rodovia, o carro parou, enguiçado. “Você sabe
alguma coisa de mecânica?”, perguntou ao motorista. “Nadinha, nadinha!” −
respondeu o soldado, rindo por dentro.
Fabino colocou os papéis debaixo do
braço e se virou para o soldado: “caso você conserte o jeep, me alcance, vou
seguir a pé ou de carona, até chegar ao acampamento”. Dito isso, partiu
resoluto. Em sua mente, via o comandante sorrindo, ao vê-lo chegar com as folha
de cartolina. Que sucesso! Achou uma estradinha e entrou por ela, achando-a
familiar. Seguiu achando que ela fazia uma curva e andou, andou. Com o tempo
nublado, não tinha certeza sequer da direção. Tinha apenas a esperança de dar
de cara com as barracas. Mas que nada. Depois de quase duas horas de caminhada
viu ao longe, à sua frente, a rodovia. Lá estava o jeep e o soldado tentando
fazê-lo funcionar. Viu o carro finalmente se movendo e gritou, mas não foi
ouvido e seu passaporte para o acampamento seguiu adiante. Teve vontade de
chorar. Não vira carro algum passando por ali, o tráfego era mínimo. Sentou-se
num barranco e pensou: o que mais poderia dar errado?
Aí, começou
a chover. Forte.
Clarival Vilaça
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