quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

Primeiros encontros: 1



Yvette Guilbert


 Henri Toulouse-Lautrec

Durante dez anos Lautrec desenhou as dançarinas de Montmartre com suas longas e graciosas pernas − tão diferentes das suas. Mas por volta de 1894, ano em que fez trinta anos, o frescor abandonara o Moulin Rouge, e a vida noturna em voga mudara-se para o coração de Paris. Uma mulher alta, de cabelos vermelhos, nariz arrebitado e braços finos envoltos por longas luvas negras, meio cantava, meio recitava suas canções obscenas nos cafés-concertos. Yvette Guilbert, filha de uma costureira, era um imenso sucesso, e o descendente de condes de Toulouse e viscondes de Lautrec ia vê-la com frequência.

Talvez ele tenha se apaixonado. Yvette não era bonita − tinha, segundo ele, o “perfil de um cisne da sarjeta” −, mas as singularidades o atraiam. Ele projetou fazer um pôster dela e lhe enviou o esboço − um perfeito (e portanto não lisonjeiro) retrato que os amigos dela insistiram em que ela reprovasse. “Fica para outra vez”, escreveu-lhe ela de modo consolador. “Mas não me faça tão espantosamente feia! Só um pouco menos!”

Encorajado, Lautrec propôs um álbum de litografias inteiramente dedicado a ela. Naquela primavera, acompanhado pelo dramaturgo Maurice Donnay, ele veio almoçar na avenue de Lilliers para discutir o assunto. Yvette estava preparada para sua baixa estatura, mas não, como escreveu mais tarde, para a “grande cabeça de cabelos pretos... o nariz grande o bastante para dois rostos, e uma boca que cortava a cara de bochecha a bochecha”. Mas os olhos por trás dos óculos eram “surpreendentemente luminosos”. Ela se preocupou com a maneira como ele sentaria na cadeira, que não tinha apoios. No almoço, seu queixo ficou apenas vinte centímetros acima da toalha da mesa, mas ele era tão boa companhia, que ela sucumbiu a seu charme.

Mais tarde veio a conhecer o seu lado amargo. No decorrer da amizade dos dois, Lautrec zombava das suas inclinações românticas; Yvette, por sua vez, o castigava bebendo excessivamente e vivendo de esmolas num bordel. As litografias foram elogiadas por toda a parte, mas a irritou que ele tivesse exagerado no grotesco. “Realmente”, disse ela, sem pensar, “você tem o dom de pintar a deformidade!’’ “Mas é claro”, respondeu ele.

Litografias da cantora Yvette Guilbert




(Do livro “Primeiros Encontros”,
de Nancy Caldwell Sorel e Edward Sorel)



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