sexta-feira, 22 de março de 2019

Teatro do absurdíssimo



Cenário: Mesa de Restaurante.

Cena: Dois amigos sentados, doutor Doctor e senhor Monsieur.

Ao fundo, gerente e garçom.

Doutor Doctor − Garçom, a conta!

Garçom − (Aproximando-se.) Mas doutor! O senhor já pagou a conta.

Doutor Doctor − Não discuta. O freguês tem sempre razão! Traga a conta que eu quero pagar.

(Garçom afasta-se.)

Doutor Doctor − (Ao seu amigo, senhor Monsieur.) Esses garçons andam terríveis!

(Garçom volta novamente com a conta.)

Garçom − Aqui está, doutor.

Doutor Doctor − (Pagando.)Toma. Pode guardar o troco.

Senhor Monsieur − Vamos embora.

Doutor Doctor − Vamos sim. Antes deixa só eu pagar a conta.

(Chama.) − Garçom!

Garçom − (Aproximando-se.) Pois não, doutor.

Doutor Doctor − A conta, por favor.

Garçom − Mas doutor! O senhor pagou duas vezes!

Doutor Doctor − Você quer discutir comigo, é?! Seu malcriado! Traga logo a conta que eu quero pagar?

Garçom  − (Assustado.) Trago sim, doutor.

Doutor Doctor − Eu não estou dizendo? Esse serviço anda péssimo.

(Garçom volta novamente com a conta.)

Garçom − (Meio com medo.) Está aqui.

Doutor Doctor − (Pagando mais uma vez.) E não se esqueça de guardar o troco.

(Garçom vai se afastando, quando doutor Doctor chama-o de novo)

Doutor Doctor − Ah, garçom. E não se esqueça de trazer a conta.

Garçom − Por favor, doutor! O senhor já pagou mais de três vezes!!

Doutor Doctor − (Levanta-se e vai saindo furioso.) É um absurdo ter que discutir com este garçom! Nunca mais eu ponho os pés neste restaurante!!! (Sai.)

Garçom − Mas eu não entendo… (Confuso.)

(Aproxima-se o gerente e pergunta)

Gerente −Afinal de contas, o que foi que houve?

Senhor Monsieur − (Que continua sentado.) Nada, não. É uma mania que o meu amigo tem de ficar pagando a conta. Toda vez que eu saio para almoçar com ele é a mesma coisa. Quer pagar sempre. Mas agora pra mim chega. Hoje quem paga sou eu. Garçom, a conta!

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(Do livro “O Astronauta sem Regime”, de Jô Soares)




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